Bernt Capra dirige este filme que foi produzido com base no livro escrito pelo seu irmão, o físico austríaco Fritjof Capra. Embora os nomes do livro e do filme originais não sejam os mesmos, no Brasil, ambos foram traduzidos como “O ponto de mutação”.
A montagem do filme é relativamente simples se comparada a filmes com uma linguagem mais hollywoodiana. O enredo é basicamente: um poeta, uma cientista doutora em física e um político norte-americano, em um dia de muita discussão e passeio pelo belo Mont Saint Michel. A simplicidade fica por aí, pois o filme é composto de diálogos muito densos do começo ao fim.
Já na primeira cena em que o trio trabalha junto, o político profissional Jack Edwards (Sam Waterson) e o seu amigo, o poeta Thomas Harriman (John Heard) ainda estão conversando sobre os motivos que teriam levado o político a ser derrotado nas eleições para a presidência dos EUA, quando, influenciados pelo ambiente, iniciam uma conversa sobre o impacto que a invenção do relógio teria tido sobre a história da humanidade. É esse o momento em que o personagem de Liv Ullmann, uma doutora em física decepcionada com a dissonância existente entre os desdobramentos práticos da sua pesquisa e a sua motivação inicial, é chamado a entrar em cena.
O político não consegue entender por que pessoas inteligentes como a doutora são desiludidas com a política nos EUA e ela, utilizando-se do relógio medieval, começa a explicar suas motivações. A tese da doutora em física quântica é que a sociedade atual sofre de uma crise de percepção e isso teria ocorrido porque o pensamento não acompanhou as transformações que ocorreram no planeta.
Daí em diante, as discussões se adensam cada vez mais e o cenário medieval do Mont Saint Michel, em algumas passagens parece se tornar mais um dos personagens do filme. As construções medievais utilizadas como cenário têm um efeito quase que dialógico no desenrolar do filme, pois elas servem de mote para boa parte das discussões; além de evidenciar as distâncias existentes entre o mundo medieval e a modernidade.
A visão de mundo cartesiana, com a sua perspectiva mecanicista e fragmentária, segundo a doutora, não daria mais conta da modernidade e teria de dar lugar a uma visão holística da realidade. Sendo assim, política, ecologia e ciência não poderiam ser dissociados, nem analisadas isoladamente em detrimento do todo. Uma série de problemas contemporâneos como a fome no hemisfério no sul, o endividamento das antigas colônias das metrópoles mercantilistas etc., são trabalhados pela doutora de modo a evidenciar as relações destes problemas com uma série de outros. Deixando clara a necessidade de uma nova percepção da vida.
Mas o que é a vida? A doutora, através da visão da física quântica, afirma que a vida é a propensão para a auto-organização. Nesse momento, o poeta que ocupa um papel secundário nas conversas ao longo de todo o filme, se torna o protagonista da cena e demonstra como a visão da vida proposta pela física contemporânea, por mais progressista que possa parecer, também é mais um conceito, uma mera fórmula, uma simplificação da extrema complexidade que é a vida.
Por Guilherme Veppo
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