domingo, 13 de junho de 2010

Lua de fel



Erótico e sensual. Misterioso, tenso, e provocador. Essas são as características que permeiam “Lua de fel” de Roman Polanski, ao contar a história de um inglês certinho, Nigel (Hugh Grant), que junto de sua esposa Fiona (Kristin-Scott Thomas) procura exotismo em uma viagem para a Índia em um cruzeiro. O casal comemora sete anos do seu casamento, que sempre foi todo dentro dos moldes convencionais.

É neste
cruzeiro que Nigel conhecerá a bela, misteriosa e sensualíssima Mimi (Emanuelle Seigner) e também seu marido Oscar (Peter Coyote), um escritor frustrado e obcecado que vive paralisado em sua cadeira de rodas. Oscar e Mimi vivem entre a dor e a paixão, e o verdadeiro amor, que os desgastou e os corrompeu. São antagonistas completos de Nigel e Fiona.

A história de Oscar e Mimi é contada pelo próprio Oscar para Nigel todos os dias em sua cabine. Nigel cada vez mais vai se rendendo e se vendo preso às histórias carregadas de erotismo e sexo do passado do casal. Nigel vai ficando obcecado por Mimi, enquanto Oscar conta como eles foram cada vez mais tentando atingir os limites, as barreiras do sexo e da paixão.

Os
primeiros 20 minutos do filme soam meio sem sentido. As cenas pulam de um cenário para outro de repente e algumas ficam cortadas. Servem para apresentar os personagens Nigel e Fiona, demonstrando rapidamente o que eles querem e procuram, e claro, quem eles são. A ressalva fica: creio que Polanski poderia ter montado isso melhor.

A partir do momento em que Nigel senta para ouvir as histórias de Oscar pela primeira vez, o filme começa a fluir e vai se construindo e ficando cada vez melhor. A construção do romance obsessivo de Oscar e Mimi é irresistível, provocadora e muito bem feita.

Tudo começa em um ônibus, com um olhar. A garota é belíssima, irresistível e o sentimento de desejo toma Oscar, que nos próximos dias fica obcecado, tentando reencontrá-la. O cenário é a sempre bela Paris, palco de antigos e ardentes romances, paixões e desejos. O reencontro acontece, e os dois saem para jantar, e logo a primeira noite de amor acontece, ao lado da lareira; um ambiente quente em um dia frio.

Os corpos ardem. Os dois se verão presos um ao outro a partir daí; longos dias sem sair de casa, o sexo acontece no chão, à mesa durante o café da manhã, atinge o masoquismo e alcança até mesmo o nível da prática obscena da “chuva dourada”. Ops! “Nada pode ser obsceno em um amor assim” diz Oscar a Nigel, horrorizado com o relato. Polanski nos prova isso com o decorrer da história. Um dos pontos altos do filme é exatamente o momento do relato dessa prática em questão. Oscar incorpora tão bem o sentimento de obsessão, que nada precisa ser mostrado, fica tudo na nossa imaginação enquanto observamos Oscar se desesperar pelas lembranças.

Esse texto pode deixar transparecer que esse filme trata do gênero de romance do modo convencional. Não é. Polanski cria uma história de amor e ódio, desejo e dor. Lua de Fel é um romance que nunca poderá dar certo, porque Oscar e Mimi se desejam demais, se amam demais. Procurando evoluir e explorar esse amor, eles atingem novas barreiras e limites cada vez mais obscuros, níveis cada vez mais altos. Quem tudo quer, acaba perdendo.

Alternando entre os momentos em que as memórias são relatadas e os momentos em que os personagens convivem no navio, Polanski nos convida a relfetir um pouco sobre a hipocrisia da sociedade moralista e convencional; essa personificada em Nigel e Fiona. Oscar provoca o casal, dizendo que eles nunca exploraram limites, que eles não dão tudo o que podem um para o outro. Nigel se horroriza, porém observa a si mesmo excitando-se e ficando obcecado por Mimi, cada vez que os relatos ficam mais quentes, cada vez que a evolução do amor deles passa para uma nova fase.

Polanski tenta mostrar que o que vale é a paixão, o desejo, os limites que cada um pode alcançar quando ama e deseja de verdade. Por mais obsceno que possa parecer o que o casal faz nos momentos íntimos, tudo é feito com um grau de paixão e romance tão sensível e ao mesmo tempo tão íntimo e bonito que vemos que realmente nada pode ser obsceno quando se ama assim.

O defeito do filme aparece nos momentos em que a história se desenvolve no navio. Fica um pouco rasa a explicação por que Oscar relata toda a intimidade de seu romance para Nigel. A explicação acontece, porém fica um sentimento de que poderia ser melhor.

Falando
agora do elenco. É notável durante o filme a segurança de Peter Coyote e Emanuelle Seigner para com seus respectivos papéis. Os dois possuem uma química excelente que torna todo o clima do filme bem real e íntimo. A sensualidade de Emanuelle é poderosa e muito prazerosa de se olhar. A atriz parece exalar sexo por todo o corpo, sua sensualidade é notável no simples ato de ‘pular amarelinhaou andar sobre o corpo de um homem durante uma dança. Falando em dança, é durante uma cena de dança que acontece um dos pontos altos do filme: Mimi dança em uma sala iluminada pela luz das velas, seduzindo Oscar, que a observa. Na manhã seguinte, Mimi se lambuza com leite, derramando-o sobre seus seios. É um deleite.

Peter Coyote, por sua vez, foi outra ótima escolha. É um homem mais velho que Mimi (que aqui tem 20 anos), e está em plena forma para seu papel. É bonito e possui um ar galante que combina com seu personagem, deixando o romance mais sensual. Sua interpretação é a de um ator que acredita no que está fazendo. Basta olhar a cena em que ele relata a “chuva dourada”. Peter e Seigner passam, como dito, uma intimidade muito natural, e sentem aquilo que estão fazendo. Isso é ótimo e torna o clima do filme mais realista e belo.

Para completar, o elenco tem Hugh Grant e Kristin Thomas. Eles não possuem o grau de interpretação dos outros dois atores, mas conseguem segurar bem seus papéis; mesmo o Grant, um ator que eu não admiro e nunca vi fazer nada demais, consegue se sair bem e não decepciona.

Com algumas ressalvas e pequenos defeitos, o filme funciona muito bem e toda a construção do romance é um deleite. Polanski trabalha bem o roteiro escrito por Gérard Brach, John Brownjohn e pelo próprio Polanski, que se baseia no romance “Lunes de fiel” de Pascal Bruckner. A direção de Roman Polanski é segura e traz bons momentos. Sua condução é excepcional e segura bem as pontas para criar um excelente clima para a história. O final é surpreendente, necessitava de uma reação melhor da atriz Kristin Thomas.

Por Rafael Lopes de Souza

Cotação: 4 / 5

Direção: Roman Polanski
Atores: Hugh Grant , Kristin Scott Thomas , Emmanuelle Seigner, Peter Coyote, Victor Banerjee
Duração: 139 min

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